quarta-feira, 29 de abril de 2009

Ianque, cai fora.

Mamãe quase me matou. Esbravejava que onde é que você estava até essa hora, viu o que aconteceu, diz pra mim que não estava lá, você podia ter apanhado, podia ter sido presa, menina ingrata e irresponsável!

Saiu no jornal e tudo mais. Mas também, o que ele esperava? Vindo aqui com essa pompa toda, em pleno regime militar, queria ser recebido com uma dancinha hippie de boas vindas? Fico me perguntando se ninguém avisou que todos nós enterrávamos o Azevedo com frequência, com o devido patrocínio da Arquietetura. Ninguém contou para ele do dia que os milicos cercaram o RU e não deixaram ninguém sair, e a gente jogou banana nos macacos? Bendito seja quem inventou que a sobremesa seria sempre fruta. E quem disse que naquele dia ia ser banana.

Poucos de nós eram corajosos de verdade, tipo o Honestino. A maioria era como eu, tremia igual vara verde, de raiva e de medo, ao se dirigir para a sala de aula e ter a ignorância vestida de preto vigiando a entrada. Teve também aquela história da menina grávida que em uma daquelas invasões da polícia levou uma cassetada elétrica e abortou o nenê. O bicho pegava para o nosso lado até mesmo na época da tal redemocratização.

O fato é que era um dia incerto de novembro de 1981, final de semestre, todo mundo estressado, um horror. Tinha um círculo de palestras no Dois Candangos, e aquele dia era o dia daquele crápula ianque. Pois ele não só ia dar uma palestra naquela universidade que tanto sofria com a ditadura que ele apoiava, como ela não era aberta aos estudantes.

Pífia tentativa de impedir agitação, coitados. Saiu do CA da Engenharia Civil um grupinho mínimo, portando uma faixa com os dizeres “Kissinger, go home!”. Se dirigiram ao minhocão gritando palavras de ordem e chamando quem estivesse por lá para se juntar ao grupo. Pessoas saíam das salas e aderiam àquilo que acabara se tornando uma passeata. Quando vi, desci correndo do mezanino e entrei animadíssima no meio. O que era um grupo de vinte pessoas se tornou um movimento gigantesco no minhocão.

Rumo ao Dois Candangos. Fechado, é claro. Não que isso fosse um problema. A palestra ia acabar mais cedo, só isso. Quem estava perto da entrada começou a bater nas portas e todos faziam muito barulho. Um risco danado de machucar as mãos se o vidro quebrasse, mas não aconteceu nada. O barulho era tanto que a palestra, é claro, teria que ser interrompida.

Se você estava na UnB nesse dia, não estava na passeata e quis comer um sanduíche de ovo com tomate em alguma lanchonete, foi nesse dia que você saiu tristinho de lá, porque simplesmente acabou. Compramos tudo. Fazia-se ali uma linha de produção, desencaixotando os ovos e cortando os tomates ao meio para jogar em quem viesse. Daí um pouco chegaram uns meninos correndo, com uns pregos nas mãos. Haviam furado os pneus de todos os carros oficiais. Só para garantir.

Não tardando a chegar, a polícia estacionou seu camburão ali perto e fez um corredor na entrada para os ministros, diplomatas, figurões e engravatados passarem. Era fabuloso jogar os ovos e os tomates por cima dos capacetes pretos e ver que tinha acertado algo no caminho.

Para fechar nossa tão feliz manifestação, o pessoal percebeu meio tarde demais que não tinha como pegar os carros oficiais. Chegou-se também ao consenso de que não seria cabível que o ex-secretário de Estado dos Estados Unidos, aquele pavão ianque que as autoridades brasileiras faziam questão de puxar o saco, levasse ovada. Partiram, então, para o grande e absurdamente hilário final: entraram no auditório com o camburão, colocaram o homem dentro e se mandaram sei lá para onde.

Vencemos a batalha. Ponto pra gente. E um bom banho pra esses catinguentos, por favor.

3 comentários:

Gabriel Cunha disse...

Lembro desse dia. Eu tava matando uma aula de ética pouca coisa antes de ir comprar ovos no elefante.

Thaís Cunha disse...

putz
eu fui inventar de matar aula EM CASA logo nesse dia.
Dei muito mole.

Luiza Queirós disse...

hehehe
hehehe